VIVA ACLIMAÇÃO
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História

O Sítio Tapanhoim e o bairro da Aclimação Limitado pelos cursos dos Ribeirão do Cambuci, Córrego do Lavapés e do Caminho de Santo Amaro (Vergueiro). Pertenceu no século XIX a José Rodrigues Cardim. Em alguns documentos surge com a denominação de Chácara do Lavapés e, posteriormente, como do Tamandaré, após sua aquisição por Manoel Baptista da Cruz Tamandaré.

O Sítio Tapanhoim e o bairro da Aclimação

Limitado pelos cursos dos Ribeirão do Cambuci, Córrego do Lavapés e do Caminho de Santo Amaro (Vergueiro). Pertenceu no século XIX a José Rodrigues Cardim. Em alguns documentos surge com a denominação de Chácara do Lavapés e, posteriormente, como do Tamandaré, após sua aquisição por Manoel Baptista da Cruz Tamandaré.

 

Foi parte desse sítio, justamente a do vale do Ribeirão do Cambuci, que interessou a Carlos José Botelho para a formação do Jardim da Aclimação, inspirado no Jardin d’Acclimation francês.

 

Carlos Botelho nasceu em Piracicaba, SP, em 14 de maio de 1855, primeiro filho de Antônio Carlos de Arruda Botelho (Conde do Pinhal) e Francisca Theodora Coelho, falecida poucos anos depois. Doutorou-se em Medicina pela Faculdade de Medicina de Montpellier, França, em 1880.

 

No seu retorno ao Brasil, desenvolveu em São Paulo sua carreira médica.

 

Enquanto Carlos Botelho ainda praticava a medicina aprendida na França, não o abandonava o sonho de construir em São Paulo um jardim nos moldes daquele de Paris, onde pudesse combinar atividades de trabalho científico com espaços para o lazer dos paulistanos.

 

Era o ano de 1891, apenas um de república e o Brasil vivia a crise econômica que recebeu o nome de Encilhamento. Os preços dos imóveis caíram e ele viu nisso a oportunidade de adquirir, pelo Estado, os campos ainda virgens do vale do sítio Tapanhoim – além da Liberdade e da Glória. Sua intenção não foi bem recebida, motivo pelo qual decidiu comprar em seu nome toda a região, que em seguida transformaria em granja leiteira, bosque, parque de diversões e zoológico.

 

O Jardim da Aclimação

 

Nesse ano, 1891, foi fundada a Companhia Jardim de Acclimação, Zoológico e Botânico.

Era uma sociedade anônima, que teve como maiores sócios o Conde do Pinhal e seu filho, Carlos José Botelho e que lançou no mercado ações visando conseguir o capital necessário para aquisição de terras e a instalação do Jardim. Atingiram 60% do capital pretendido, o que foi suficiente para a construção do Jardim sonhado pelo médico Carlos Botelho com inspiração no Jardin d’Acclimation de Paris, que frequentou enquanto estudante, um dos vários jardins de aclimatação já existentes em cidades europeias, que visavam apresentar ao público uma amostra de plantas e animais exóticos coletados em lugares ainda pouco explorados.

 

O plano da companhia era que os terrenos para além da dimensão e quantidade de água necessárias para o Jardim, seriam revendidos e o lucro revertido em benfeitorias.

 

No entanto, a época era de severa crise financeira, o que levou os sócios a proporem a desativação da Companhia já em 1894.

O Jardim da Aclimação chegou a ter 200 mil metros quadrados de área, mas com a abertura das ruas Muniz de Souza e Pedra Azul restaram os atuais 112 mil metros quadrados.

 

O Jardim da Aclimação foi inaugurado em 13 de maio de 1892, com presença do presidente e do vice-presidente do Estado de São Paulo, presidente da Câmara e de diversos ministros.

 

Dois enormes portões de ferro davam acesso ao Jardim da Aclimação: o principal, voltado para a Avenida Aclimação e o secundário no final da Rua Muniz de Souza, que não se comunicava com a avenida, usado preferencialmente pelos moradores do Cambuci. O primeiro, servido pelo bonde nº 28, de nome “Aclimação” saía da Praça da Sé, permitindo que paulistanos de outros bairros e visitantes em geral – do interior do Estado, de outros Estados e até do exterior, fizessem” o passeio mais agradável e instructivo de São Paulo”, conforme anúncio da época. O jardim abrangia a hoje Praça Jorge Cury, a escadaria dupla com o mirante, indo até a parte mais elevada, onde fica a Praça General Polidoro e ruas adjacentes.

 

Entretenimento não faltava. Ao entrar pelo portão da Avenida, o visitante se encontrava em uma larga e bem cuidada alameda e, pela sombra das frondosas árvores podia circundar o lago. De um lado ficavam as diversões, o bosque e a “vacaria”; no outro, o zoológico.

 

No lado das diversões, havia um salão de baile, com banda executando os ritmos da época: maxixe, polcas, xote, valsas e o “charleston”. Muitos pares dançavam ali nas domingueiras.

 

Além do rinque de patinação havia, enfileiradas de frente para o lago, barracas com atrações semelhantes às que conhecemos nos parques de diversões e nas quermesses de festas juninas.

Outras barracas haviam, porém, a mais procurada era a do cineminha. Por um sistema de fotografias contínuas, movidas por engenhoso mecanismo elétrico, o espectador, ao olhar pelo visor especial, tinha a impressão de assistir a um espetáculo cinematográfico.

 

A leiteria, intitulada em francês “cremérie”, oferecia laticínios de primeira qualidade, produzidos a partir do leite de vacas da alta linhagem, selecionadas de raças bem apuradas e que faziam parte dos estábulos da vacaria do Jardim.

O cenário de fundo eram a vasta plantação de eucaliptos, a vacaria e o silo cilíndrico pintado de branco – talvez o primeiro da América do Sul, construído para armazenagem racional de forragens (plantas ou grãos para alimentação do gado).

 

Os jornais estampavam anúncios sobre o Zoológico, a parte do Jardim que mais o notabilizou.

Nesse período o Jardim da Aclimação vivia seu ponto mais alto. No entanto, o já Senador Carlos Botelho não dispunha mais do tempo necessário para dar a atenção requerida por essa obra monumental. Por isso entregou a administração um dos seus filhos, o Dr. Antônio Carlos Arruda Botelho, que tinha o mesmo nome do avô, o Conde do Pinhal.

 

A existência de um Zoológico como era o da Aclimação, com fauna tão variada e, principalmente, com grande quantidade de macacos, foi propícia à criação de um laboratório de pesquisas, na sede da Sociedade Hípica Paulista, fundada por Carlos Botelho, que funcionava dentro do Jardim e mais tarde fora transferida para o bairro de Pinheiros. O laboratório foi então ampliado, transformando-se no Instituto Botelho de Cancerologia, por obra de Carlos Botelho Júnior, autor da “Reação Botelho”. O Instituto encontrou no zoológico vasto campo para investigações sobre tumores malignos espontâneos dos animais.

 

Na década de 1930 a família Botelho iniciou o parcelamento das terras de propriedade privada adjacentes ao Parque. É quando, em 1939, a Prefeitura de São Paulo compra da família o Jardin d’Acclimação, já em declínio, para evitar seu loteamento e visando sua incorporação ao patrimônio da cidade.

Anos antes Carlos Botelho transferira todas as propriedades para os filhos, que, dos lotes destinados à venda, conservaram alguns para distribuição entre os netos do fundador. Acentua-se o declínio. O que restava dos animais foi retirado e o primeiro Zoológico de São Paulo extinto.

 

A história do bairro Aclimação ocorre, portanto, em perfeita simbiose com a história do Jardim. É assim que, na planta de 1916, a região toda – compreendendo, de um lado, o trecho desde as ruas Pires da Mota, Cururipe, Espírito Santo, José Getúlio e a própria Avenida do Jardim da Aclimação (até o quarteirão que recebeu o nome de Turmalina) e, do outro lado, um pequeno trecho das ruas Nilo, Loureiro da Cruz e Rodrigo Cláudio – a Avenida chegando então até o Jardim, o traçado inicial das ruas Dr. Nicolau de Sousa Queirós e Jurubatuba (já no limite da Vila Mariana), passa a ser chamada simplesmente de Aclimação. Todas elas, ruas que foram sendo abertas já com as características que acompanharam todo o arruamento do futuro bairro, isto é, seguindo o relevo natural do terreno, aproveitando baixadas, subindo, descendo e contornando colinas.

 

A urbanização dessa área somente irá se efetivar mais de 40 anos após a criação do Jardim, em torno de um arruamento projetado pelo Escritório Ramos de Azevedo –partindo da praça que atualmente leva o nome de General Polidoro.

A novidade estava nos nomes de pedras preciosas dados às vias públicas que formavam um leque em torno de um Largo originalmente denominado Rodrigues Alves que, a partir da planta de 1930, passou a ser designado pelo nome atual de Praça General Polidoro.

 

Aberta pela Prefeitura nos primeiros anos do século XX no "Morro da Aclimação", esta praça serviu durante anos como um "campinho de terra" para a prática de futebol por integrantes do Clube República, fundado por jovens da comunidade. Nos mapas da cidade de 1916, o espaço da praça

já aparece demarcado, sem denominação. Em 1924, ela já estava pronta e recebia o seu primeiro nome oficial: "Praça Dr. Rodrigues Alves" ou Conselheiro Rodrigues Alves. No dia 11/04/1931, a sua denominação foi alterada para "Praça General Polidoro", uma homenagem ao General Polidoro da Fonseca Quintanilha Jordão. O General Polidoro nasceu no Rio de Janeiro em 02 de novembro de 1792. Distinguiu-se, na Guerra dos Farrapos e na Guerra do Paraguai.

www.dicionarioderuas.prefeitura.sp.gov.br

 

Parece-nos, ao ler o conteúdo dos documentos, que essa área fazia parte da Chácara Saphira (Safira). Faz sentido concluir que o nome Safira tenha inspirado os demais para designar as ruas adjacentes à praça: Rubi, Esmeralda, Diamante, Ágata, Turmalina, Safira. Inicia-se também nesse momento o traçado das ruas com nomes de planetas: Júpiter, Saturno e Urano. Nessa região montanhosa, lembram os antigos, existiu um campo de futebol do República Futebol Clube. Continuando em frente, pela Avenida Turmalina, chegava-se ao pé do morro, de onde se descortinava a paisagem do Jardim da Aclimação. Ainda hoje, desgastado pelo tempo e ausência de preservação, lá se encontra o mirante, a parte superior de um salão circular, com escadarias em curva terminando na praça que leva o nome de Jorge Cury. O mirante e a praça eram originalmente parte integrante do Jardim da Aclimação, até a abertura da Rua Muniz de Sousa. Hoje é território administrado pela Subprefeitura Sé.

Tudo isso era parte do Morro Vermelho, depois denominado simplesmente Morro da Aclimação, do qual Carlos Botelho era parcialmente proprietário. Na localidade conhecida por Chácara do “Quebra-Bunda” foi, mais tarde, construído o Tênis Clube Paulista, cuja primeira piscina foi um manancial natural de água. A “chácara”, como normalmente a chamavam quando vinham ao Morro os filhos de Justino de Azevedo, seu proprietário original, possuía imensas plantações de cana, cevada e outros cereais, ração para as vacas e árvores de uma fruta chamada cambuci, também farta nas terras vizinhas. Havia ainda uma granja leiteira cuidada por dois vaqueiros, que vendiam o leite levando-o em carrocinhas por toda a cidade. Nas terras junto da Avenida Lins de Vasconcelos moravam os cabreiros, que também vendiam leite em domicílio. No nº 335 da atual Rua Topázio morava o cortador de canas para o gado e, bem em frente, ficava o curral. A casa do caseiro ficava onde está construída a Igreja de Nossa Senhora do Carmo.

Bruno di Tolla, vencedor da corrida em torno da Lagoa Aclimação em 1925 por ocasião do Festival da União dos Trabalhadores Gráficos, conta à autora do livro “Aclimação”, que se ia para a Aclimação com o bonde nº 28, partindo da Praça da Sé e indo até o Jardim. Mas só aos domingos e feriados, porque o lugar era deserto, afastado da cidade e muito perigoso, um verdadeiro bosque onde havia poucas residências só utilizadas pelos proprietários para férias ou fins de semana. Outra depoente relata que, na década de 1930, uma comissão de moradores solicitou que o bonde fosse substituído por ônibus, porque consideravam o bonde já ultrapassado. A solicitação foi logo atendida e isso se deve, em parte, ao privilégio de morar no bairro o político que chegou a governador do Estado, Lucas Nogueira Garcez.

E porque fazia parte dessa comissão o escritor Monteiro Lobato, residente na esquina das ruas Alabastro e Topázio, onde faleceu em 1945.

A Praça General Polidoro era ponto de encontro dos jovens para o “footing” noturno. E no final do ano, na noite de 31 de dezembro, rapazes e moças se reuniam para comemorar a passagem do ano, festa que terminava com todos se jogando na água do lago central. Trata-se de um espelho d’água, atualmente vazio. Até a década de 1940 e início dos anos 1950, lá havia o atrativo da retreta da banda musical da Força Pública, para onde acorriam as famílias, que se deliciavam com as canções e marchas.

 

Referências

DOREA, Augusta Garcia Rocha. Aclimação (coleção História dos Bairros de São Paulo),

09/1983 – Prefeitura do Município de São Paulo, Secretaria Municipal de Cultura; Contém NOTA

no capítulo O Jardim da Aclimação e seu apogeu na década de vinte, creditando as informações

a artigo de autoria de Domingos d’Enunzio, intitulado “Jardin d’Acclimation”, publicado em fins

de 1968 na Folha do Cambuci.

ARANHA, Antonio Carlos Botelho Souza. Carlos Botelho – Nasceu no século XIX, viveu no XX e

vislumbrou São Paulo do século XXI. São Paulo. Edição do Autor, 2011.

 

Texto compilado e redigido por Dalva Soares Bolognini, maio/2016